domingo, outubro 15, 2006

“O rosto iluminado, que não pedia nada, que simplesmente existia, aguardando – era um rosto vazio, ele pensou; um rosto que podia mudar com qualquer sinal de expressão. Podia-se sonhar nele qualquer coisa. Era como uma bela casa vazia esperando pelos tapetes e quadros. Tinha todas as possibilidades – podia se tornar um palácio ou um bordel. Dependia de quem o enchesse. Como era limitado, em comparação, tudo que já estava completo e rotulado!”
Erich Maria Remarque.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Amadora

Amadora acorda os sentidos. Voa pelos quatro cantos sem sair da cama. Levanta o nariz. Percebe o cheiro da vida no mundo. Amadora é uma criança. Não nasce. Não cresce. Não se reproduz. Não morre. Amadora ama.
Ama o infinito, o universo sem fim. Ama infinitamente.
Amadora dói. Amar dói. Não pela falta de bem querer. Ela reconstrói os sentimentos de hora em hora. Toma remédio pra esquecer. Toma remédio pra lembrar. É hipocondríaca.
Amadora se esforça pra ser vista. Pula. Estica o pescoço pra ver. É muito pequena ainda. Quer aparecer. Gosta de aparecer. Porque quer ter a certeza de existir. De não ser um mero espião atrás dos olhos de um robô de aço. Quer sentir o sangue correndo nas veias. O pulsar de um coração dentro de uma vida que ela não viveu.
Amadora quer saber se o mundo tem razão. Será que ele também existe? Ou é só sonho? Sonho de quem? De Deus? Quem é Deus? Um sonhador?
Amadora abre os braços. Abre a porta. Quer tentar. Quer ir além e não sabe ainda de quê.
Como dar o primeiro passo se ainda não aprendeu a andar? Onde precisa chegar?
Amadora quer doer.